“Quantas perseguições sofri, e o
Senhor de todas me livrou” (2 Tm 3.11)
Lendo o texto podemos perceber que Deus nem sempre
livra o cristão do sofrimento (Jó 1.21; 2.10; Sl 119.50; Jo 16.33; 2 Tm 4.5; 1
Pe 2.20). A experiência de Paulo foi algo isolado e não é uma regra geral para
os filhos de Deus. Será que Ele vai me livrar das aflições, como o salmista
mesmo disse no salmo 34.19? A proteção divina na carne não é uma garantia
integral. Mas como isso pode acontecer? Afinal, os cristãos não são seus filhos
herdeiros?
Depois que o pecado entrou na humanidade, o ser humano
veio a se distanciar do Criador, permitindo o surgimento de mazelas sobre sua
vida. A morte física, sucessivamente, passou a fazer parte da vida das pessoas,
sem distinção de etnia ou de posição social (Sl 89.48). Satanás tentou arruinar
a coroa da Criação pondo-a em conflito contra Deus. Entretanto, o Altíssimo no
livro de Gênesis anuncia a Serpente sua futura ruína com a Semente da mulher
(Gn 3.15).
A vinda do Messias proporcionou a vitória sobre Satanás;
a morte eterna, enfim, foi derrotada (Is 25.8; 1 Co 15.54; 2 Tm 1.10; Ap 21.4).
Hoje todos que se aproximam de Cristo são perdoados os pecados e têm a Vida
Eterna (Jo 3.18,36). O futuro para os que se convertem ao Senhor é de paz e de
alegria, pois o Paraíso é dado como herança aos crentes fiéis em Jesus.
O leitor pode ainda questionar: Mas por que Deus não
aniquila nosso sofrimento todo de uma vez? Quando estudamos as Escrituras
Sagradas e entendemos a vontade de Deus em nossas vidas (Rm 12.2; 8.28), logo
percebemos que seria muito fácil voltar-se para Ele sem que os sofrimentos e os
problemas diários nos afligissem. Mas que proveito, ou glória, o cristão teria
quando chamado de “vencedor”, sua vida tiver sido um mar de rosas?
Na epístola do apóstolo Pedro está escrito: “Amados, não estranheis a ardente prova que
vem sobre vós, para vos tentar, como se coisa estanha vos acontecesse” (1
Pe 4.12). O cristão não deve achar estranho ou incomum as provas que lhe
sobrevém. Para ele é uma honra padecer como Cristo (v. 16). Temos de entender
que quanto maior o sofrimento maior a alegria e a glória (v. 13). Sabendo que devemos
glorificar a Deus nos sofrimentos (v. 14). A ardente prova que Pedro se referiu
tem um propósito divino, embora tenhamos dificuldades de entender o porquê
“disso” ou “daquilo”.
Não devemos nos regozijar no sofrimento em si, mas no
fato de que somos participantes das aflições de Cristo. Pedro já havia
comentado nos versículos anteriores a questão do sofrimento cristão (1 Pe 1.6-9).
Esses irmãos a quem o apóstolo se dirigia estavam sendo perseguidos pelo
imperador. A perseguição se deu porque rejeitaram a ordem de adorá-lo, e
escolheram servir a Cristo. O problema do sofrimento sempre tem desnorteado os
cristãos, mas o caminho para a glória passa por resistência e oposição (Beacon).
Pedro disse que os irmãos sentiriam alegria tamanha na vinda de Cristo ou “na revelação da sua glória” (1 Pe 4.13).
Mesmo “contristados com várias tentações”
(1 Pe 1.6) os cristãos estavam alegres e confiantes na glória que seria
produzida neles se continuassem perseverantes na fé em Jesus. A fé do crente
mostra-se autêntica quando provada pelo fogo (1 Pe 1.7). O ouro é purificado
pelo fogo, onde se tira dele (ouro) toda impureza. Assim é a nossa fé. Ela será
testada e aprovada por provações. É no “fogo” que nossa alma é purificada pela
separação de toda impureza, e assim, será manifestado o caráter de Cristo em
nossas vidas.
Em sua primeira carta a Timóteo, Paulo diz que apesar
das perseguições e aflições que havia passado o Senhor lhe tinha livrado de
todas elas (2 Tm 3.11). O doutor dos gentios passou a conhecer a vontade do
Senhor logo que sua vida se transformara. Entendia que o plano de Deus era de
levá-lo a alcançar muitos gentios à salvação e teria que sofrer muito para
conseguir seu objetivo. Quanto mais aumentava seus sofrimentos, mais Paulo se
firmava em Cristo. Ele suportou tudo por amor a obra do Senhor. Buscava regozijar-se
em Deus que lhe daria a coroa da justiça. Os inimigos tiveram muitas
oportunidades de exterminá-lo, mas não conseguiram porque Deus sempre o
livrara. Paulo sabia que teria de morrer, mas entendia que o Eterno o guardaria
para seu Reino celestial (2 Tm 4.18). Essa era a verdadeira esperança do
apóstolo.
O cristão não decide a forma e o dia de morrer. Já ouvi
alguém dizer: “Ah, eu quero morrer na velhice, e quando estiver dormindo”. Deus
é quem decide o momento e a forma de nossa partida. Cabe ao cristão apenas
perseverar na fé; e no final de tudo, ser salvo. E como Paulo foi salvo por
Deus de muitas auguras dos inimigos, isso não significa que a experiência do
apóstolo de livramento deva ocorrer sempre em nossa vida. Deus o guardou porque
essa era a vontade dEle naquele momento. E como a morte alcança todos e não
escolhe o tipo de pessoa, do pó viemos e ao pó voltaremos (Ec 12.7).
Deus prometeu um dia dar-nos tudo que precisamos, mas
nossa condição ainda é de conservarmos viva nossa fé, vivendo uma vida pura e
de obediência a Sua Palavra, a despeito das circunstâncias. É um caminho
espinhoso, óbvio, mas não deixa de ser glorioso. Os cristãos seguem as pisaduras
do seu amado Mestre. Diz o apóstolo Pedro: “(...) Porque é coisa agradável que alguém, por causa da consciência para com
Deus, sofra agravos, padecendo injustamente. (...) Porque para isto sois chamados, pois também Cristo padeceu por nós,
deixando-nos o exemplo, para que sigais as suas pisadas” (1 Pe 2.19,21). Pedro
ainda destaca sendo melhor padecermos como cristãos (pelo nome de Cristo) em
vez de sofrermos como homicida, ladrão ou malfeitor (1 Pe 4.14-16). Se
estivermos ao lado do Senhor tudo concorrerá para nosso bem (Rm 8.28).
O cristão é sujeito a muitas aflições nesta vida. Jesus
mesmo disse que no mundo teríamos aflições, mas que tivéssemos bom ânimo, pois
Ele já o havia vencido (Jo 16.33). Deus, ao mesmo tempo em que nos livra de alguns problemas, pode
permitir que passemos por eles,
ou simplesmente padecermos com eles.
Por que não? A Bíblia registra casos de pessoas que foram salvas dos problemas,
outras que os suportaram, mas também relata mártires, ocasionados por eles em
nome do amor a Deus. Vejamos alguns desses exemplos na Bíblia.
Abel
Abel era pastor de ovelhas (Gn 4.2). Certo dia foi
oferecer sacrifício ao Senhor juntamente com Caim, seu irmão. Deus não atendeu
a oferta de Caim e aceitou a de Abel. Com ciúmes, Caim tira a vida de Abel (Gn
4.2-10).
Surge, então, a pergunta: O Senhor não poderia livrar
Abel da morte, impedindo que Caim destruísse sua vida? Sim, mas não o fez. Deus
não aceitou a oferta de Abel e rejeitou a de Caim? Isso mesmo. Ele permitiu (não
que concordasse com isso) que Caim matasse Abel. Não cabe a nós entendermos detalhadamente
todos os planos de Deus. Por sua Santa Palavra, necessariamente compreendemos
que, Ele é Justo assim como todos os seus caminhos (Dt 32.4; Jó 4.17).
José
O jovem José foi levado ao Egito como escravo (Gn 39.1).
Foi maltratado por seus irmãos. Foi Humilhado. Sofreu terríveis dores. Apesar
disso, Deus o abençoou e o exaltou a governador daquele país (Gn 41.38-44).
Em algumas situações de nossa vida não entendemos o
propósito de Deus, mas sua vontade é sempre boa, perfeita e agradável para
conosco. O sofrimento nos ensina grandes lições. E todas as coisas cooperam
para o nosso bem (Rm 8.28).
Jonas
Deus ordenou que Jonas fosse a Nínive anunciar o juízo que
Ele enviaria à cidade (Jn 1.2). O profeta ousadamente teimou e decidiu não ir. Ele
partiu fugindo para outra região e embarcando em um navio que ia para Társis
(cap. 1.3). Uma tempestade então sobreveio ao navio, e Jonas logo entendeu que
Deus estava furioso com a atitude dele (cap. 1.4). Pulou ao mar e um enorme
peixe o tragou (cap. 1.17).
Jonas estava agora dentro daquele enorme peixe. Nas
entranhas do peixe orou a Deus implorando seu perdão. O Senhor então ouviu sua
oração e ordenou ao peixe vomitar o profeta. Chegando a Nínive, Jonas prega o
juízo de Deus e muitas almas naquela região arrependem-se, voltando para o
Eterno (cap. 3.5-10).
Aprendemos que o sofrimento, às vezes, decorre de
nossas próprias falhas. O perdão de Deus não anula as consequências de uma ação
pecaminosa (Gl 6.7,8).
Jó
Este sofreu muito. A Bíblia diz que Jó era sincero, reto,
temente a Deus e se desviava do mal (Jó 1.1). Ele é apresentado como um homem
próspero por Deus (cap. 1.3,10). No dia em que os anjos se reuniram para
adorarem o Altíssimo, o Diabo apareceu no meio deles (cap. 1.6). Ele então é
questionado por Deus sobre Jó (cap. 1.7,8). A intenção de Satanás era mostrar a
Deus se Jó continuaria a obedecer-lhe caso perdesse tudo que tinha (cap. 1.9-12).
Depois de passada a tribulação, sucedeu que Deus vira o
cativeiro de Jó. Seu sofrimento já havia passado. Agora o Senhor lhe dava tudo em
dobro (cap. 42.10,12).
Davi
Davi disse que “muitas
são as aflições do justo, mas o Senhor os livra de todas” (Sl 34.19). Ele
tinha tido muitas experiências de fugas diante dos seus inimigos. Sabia o que
era ser perseguido e aflito. Teve fé em Deus que o protegeu até o fim da sua
vida.
João Batista
João Batista foi escolhido por Deus com a missão de preparar
o caminho do Messias (Mt 3.1-3). Foi preso por Herodes Antipas, e
antecipadamente chegou a ser morto. Sua cabeça foi posta numa bandeja por ordem
de Herodias, esposa do rei (Mt 14.1-14).
Por que o Altíssimo não poupou a vida do profeta João
Batista? Se Jeová permitiu que assim fosse, quem seria eu para impedi-lo ou
questioná-lo? Que seja feita apenas sua vontade.
Pedro e Tiago
Tiago foi morto por ordem de Herodes. Logo depois
mandou prender Pedro. Pedro, talvez, poderia pensar que, o que ocorreu a Tiago,
aconteceria o mesmo com ele. A igreja, contudo, não cessava de orar pelo apóstolo.
Então, um anjo aparece a Pedro e o tira milagrosamente da cela (At 12.1-17).
O internauta pode argumentar: Por que Tiago teve de ser
morto e Pedro permaneceu vivo? Agora me responda: Ele não teria de morrer
depois mesmo? Não faz diferença Deus levá-lo naquele momento ou anos após. Agradou
a Ele preservar Pedro e chamar Tiago para si. Não devemos temer a morte (2 Cr
20.15; Sl 27.1; At 27.21-26). Ela é a passagem para o Paraíso.
Jesus
O Filho do Altíssimo também não esteve imune ao
sofrimento. O profeta Isaías o descreveu como um homem de dores. Ele teve de
assumir as consequências do pecado, que era nosso, sobre sua vida. Foi
rejeitado por maioria dos judeus (Jo 1.11). Os religiosos negavam sua
divindade. Estando na cruz foi humilhado e escarnecido. Alguns diziam: “Confiou em Deus; livre-o agora, se o ama;
porque disse: Sou Filho de Deus” (Mt 27.43). Deus não poderia salvá-lo
naquele instante em que estava no madeiro. Também não deixou de amar seu Filho
em meio ao seu sofrimento. O Senhor Deus amou o mundo, por isso agradou a Ele
“moer” Jesus, para nos dar salvação (Is 53.5,10). O Messias teria que passar
por tudo aquilo para que a graça e a verdade de Deus alcançassem os crentes (Jo
1.17).
Amém?
Aijalon de Sousa Santos